PERFIL PORTUGUÊS NA COLONIZAÇÃO DO
BRASIL
Os portugueses que aqui
chegaram para o processo de colonização, traziam consigo suas leis, cultura e
religião. Por mais que nas colônias, entrassem em contato com outras culturas,
elementos de suas origens eram mantidos ou resinificados durante a colonização.
Mesmo com algumas alterações ou mudanças comportamentais, o modo de vida
português e suas práticas cotidianas, são evidentes no início da ocupação das
novas terras. Essas características estarão presentes em todo o contexto
social, econômico e cultural do nosso Engenho de Santana na Capitania de
Ilhéus.
Alguns autores apontam
uma certa originalidade da cultura portuguesa, em relação a outros países
europeus. Em razão da sua localização geográfica privilegiada na Península
Ibérica, os portugueses tiveram uma relação muito próxima com outras
civilizações, além das europeias. Em trabalho sobre a História da Bahia e
traçando um perfil dos primeiros colonizadores que aqui chegaram, Alfredo Matta
aponta que as principais cidades Portuguesas e Espanholas, tiveram suas origens
em antigas civilizações africanas. Segundo o autor, foram mais de 1000 anos de
dominação dos africanos, até que por volta de 200 a.C., com a vitória dos
Romanos nas Guerras Púnicas, a península ibérica passasse por um processo de
transformações profundas.
Foram
800 a 700 anos de hegemonia Romana que resultaram na profunda latinização da
região. A vitória Romana se deu sobre os africanos. Isso significou, desde
aquele momento, que os Romanos passaram a utilizar o argumento da cor da pele
como elemento de distinção entre a nova e a velha hegemonia. Dos romanos, além
da língua, de diversos hábitos alimentares, festas, religião, dentre as quais o
cristianismo, a península herdou suas principais instituições: a estrutura
urbana, a ideia de câmara e de prefeito, a cidadania, a representação por voto,
as municipalidades. É impressionante como até hoje as estruturas
organizacionais e instituições do Brasil são tão romanas. Isso por herança
portuguesa. (MATTA, 2013, p.20)
Com o fim do império
romano, em consequência das invasões dos povos germânicos, ocorreram outras incursões
na península ibérica, desta vez dos africanos islâmicos, que dominaram a região
por quase 8 séculos, até serem expulsos pelos cristãos no século XV. Estes
fatos, são importantes para se compreender que as Grandes Navegações que
culminaram no achamento do Brasil, estão inseridas no contexto de tomada da
península ibérica por parte dos cristãos desde o século VIII. Essas disputas
formaram uma cultura riquíssima para Portugal e Espanha.
Estas disputas
territoriais, e as constantes batalhas pela expulsão dos mouros na península
ibérica, formaram em Portugal uma classe de grandes guerreiros cristãos; já que
em razão do conflito, precisava constantemente aprimorar técnicas de guerra e
navegação, para defesa de seu território. Essa cultura belicosa foi fundamental
durante as conquistas coloniais, principalmente aqui no Brasil. O português
chega bélico e estabelece esta tradição guerreira de milhares de anos na região
de Ilhéus. Além disso, pela característica da península, fica evidenciado que a
cultura ibérica está participe da interação cultural, há muito tempo.
Segundo Sergio Buarque de Hollanda, os
portugueses davam muita importância ao indivíduo em sua originalidade e
autonomia, como se este, não dependesse de ninguém, “ cada qual é filho de si
mesmo, de seu esforço próprio, de suas virtudes” (HOLANDA, 2007, p.32), uma
ideia de superação e desafio. Estas características partilhadas pelos Ibéricos
na época moderna, foram fundamentais para as aventuras ultramarinas, incluindo
a nossa região sul da Bahia. O historiador Antônio Manuel Hespanha, aponta
algumas outras características dessa sociedade.
Já
veremos, na verdade, que os portugueses não eram apenas isso; que eram também
(e sobretudo) católicos, que eram (muito menos) europeus, que eram hispânicos;
que eram, depois, minhotos ou beirões; vassalos do rei ou de um senhor;
eclesiásticos, nobres ou plebeus; homens ou mulheres. E que, sendo tudo isto,
sem deixarem de ser portugueses, eram portugueses de uma maneira muito menos
nítida e unidimensional do que o hoje supomos, à luz dos paradigmas de
distinção nacional (agora, em português) estabelecidos desde o século passado
(SILVA e HESPANHA, 1993, p. 19).
A nobreza portuguesa dos
séculos XVI e XVII era entendida como uma virtude familiar, transferível por
laços de sangue ou por fama adquirida no exercício de algumas atividades
sociais. Mesmo com as transformações sociais ocorridas no contexto do
Renascimento e da Reforma Religiosa, e a possibilidade de ascensão social por
parte de classes sociais mais baixas; essa dinâmica social esbarrava na
tradição corporativista de uma nobreza familiar. Entende-se por família
portuguesa no período, como pessoas que vivem sob a mesma casa, estabelecendo
uma noção de hierarquia e autoridade, que transcende conexões genealógicas.
Porém essa relação se fortalece quando se trata de pais e seus filhos, para os
portugueses os filhos seriam uma continuação dos pais. Estas características e
experiências vividas serão trazidas pelos lusitanos no início da colonização,
tanto na doação das capitanias hereditárias, quanto na doação de sesmarias.
Os primeiros portugueses
que chegaram para iniciar o processo de colonização no Brasil, buscavam
enriquecimento fácil e o viver de nobreza europeu. Isso ficava evidente na
noção de riqueza com a posse da terra, e os lucros que dela poderia se obter.
Tanto que as primeiras medidas tomadas por Mem de Sá quando recebe as sesmarias
na capitania de Ilhéus, é erguer engenhos de cana de açúcar, um deles o Engenho
de Santana. O senhor de engenho seria a principal alternativa para o
enriquecimento nos trópicos.
O
ser Senhor de Engenho é título a que muitos aspiram, porque traz consigo o ser
servido, obedecido e respeitado de muitos. E se for, qual deve ser, homem de
cabedal e governo, bem se pode estimar no Brasil o ser senhor de engenho,
quanto proporcionalmente se estimam os títulos entre os fidalgos do Reino.
Porque engenhos há na Bahia que dão ao senhor quatro mil pães de açúcar e
outros poucos menos, com cana obrigada à moenda, cujo rendimento logra o
engenho ao menos a metade, como de qualquer outra, que nele livremente se mói;
e em algumas partes, ainda mais que a metade (ANTONIL, 1997, p. 75).
A divisão do Brasil em
Capitanias Hereditárias e suas doações para pessoas de grande cabedal social e
financeiro de Portugal deveria ser a via de regra para o processo colonizador.
A Carta de Doação da capitania de Ilhéus data de 26 de junho de 1534, assinada
em Évora pelo Rei de Portugal, D. João III a Jorge de Figueiredo Correia,
escrivão da Fazenda Real, além de grande comerciante, e um dos homens mais
ricos de Portugal. De acordo com a Carta de Doação:
“...
cinquenta léguas de terra da dita Costa do Brasil e que começaram na ponta da
Bahia de Todos os Santos da banda do sul, e correrão ao longo da costa dito Sul
quando couber nas cinquenta léguas se estenderão, e será de largo ao longo da
costa, e entrarão, na mesma largura pelo sertão, e terra firme adentro quanto
poder entrar, e for de minha conquista, com todas as ilhas, que houver até dez
léguas ao mar da fronteira digo na fronteira e demarcação das cinquenta
léguas...” ( Carta de Doação – Anexo 1, p.2)
Entre
os direitos e deveres dos donatários estavam; garantir a doação da capitania,
fundar vilas com até seis léguas entre si, exercer poderes judiciários,
aplicando pena de morte em determinados casos, defender as terras contra
possíveis ataques estrangeiros. Era reservado a coroa o direito de 20% dos
recursos naturais retirados do território.
O Donatário da capitania, Jorge de
Figueiredo Correa, homem de muito prestígio social na corte lusitana, não
abandona seu alto cargo a fim de se aventurar em terras pouco conhecidas.
Diante disso, envia como Loco Tenente, o castelhano Francisco Romero, um homem
bravo e considerado e considerado grande guerreiro, para dar início a
colonização nas terras de Ilhéus.
A sede da capitania seria
estabelecida na Ilha de Tinharé, porém topógrafos da armada de Francisco
Romero, encontram um local de melhor defesas naturais, com solo bastante fértil
e localizada no centro da orla marítima da capitania, “num promontório formado
pelo mar e por um rio navegável, apresentando pelagoso e abrigado fundeadouro,
vigiados os dois pontais de sua barra por sendos morros” (CAMPOS, P.35); assim a vila iniciada em Morro de São Paulo é
abandonada e se inicia uma nova sede da capitania, a vila de São Jorge dos
Ilhéus, em homenagem ao santo católico e ao donatário da capitania; as
primeiras povoações se estabelecem no morro de
São Sebastião, no atual bairro do Outeiro
“
Bahia que se chamou dos ilhéus, tanto pela sua amplitude, como pela
circustancia de estar de situada em paragem mais central da capitania, e ainda
pela excelência de terras que se encontravam naquela parte do continente,
ofereceu condições que não podiam comparar com aquela estreiteza de Tinharé”
(Rocha Pombo, III, p.245)
Logo
estabelecido o local da capitania, Francisco Romero tratou da construção de
fortificações com o intuito de evitar possíveis ataques indígenas; porém,
segundo o cronista Silva Campos, logo após vencida a resistência indígena dos
primeiros anos, houve uma boa relação com a população tupiniquim, sendo estes
de inestimável ajuda na construção de casas, abertura de estradas e construção
de engenhos. O naturalista português Baltasar da Silva Lisboa salienta que “ao
invés de procurarem viver bem com aqueles, só quiseram dominá-los e cativá-los.
Maltratavam-nos, apossavam-se de suas mulheres e de suas provisões” (CAMPOS, p.
38). Evidenciando assim, que essa aparente paz e animosidade se dava através de
violência e desrespeito a populações locais.
Em Portugal, o donatário tentava se
articular com pessoas de grande poder aquisitivo, doando grandes sesmarias,
para que assim conseguisse desenvolver a capitania. Para tanto, Jorge de
Figueiredo doou uma sesmarias a Mem de Sá, futuro Governador Geral do Brasil.
Nesta sesmaria que iria se desenvolver um grande engenho de açúcar, o Engenho
de Santana, localizado às margens da ribeira de Santana.
Os
investimentos iniciais surtiram grande efeito no desenvolvimento da capitania,
grandes fazendas se estabeleceram, atraindo uma gama de aventureiros. Segundo
Barbosa, parafraseando Tomé de Souza, primeiro Governador Geral do Brasil, “A
vila de São Jorge a ser a mais próspera e rica de todo o Brasil, a ponto de Tomé
de Souza assim se expressar em carta dirigida a D. João II: “é a melhor coisa
desta costa para fazendas e que mais rende agora para si Alteza”. (BARBOSA,
p.32); Com a morte de Jorge de Figueiredo Corrêa, a capitania é passada ao seu
filho, Jerônimo Alarcão, este consegue licença para vender a capitania, a Lucas
Giraldes, grande banqueiro e mercador português, nesse período a Capitania
chegou a ter oito engenhos de cana de açúcar. (BARROS, p.50)
A
administração dura de Francisco Romero, gerou grande mal estar com os colonos,
a ponto de estes se organizarem, prendendo e expulsando o Loco Tenente para
Portugal. Porém, contrariando a decisão dos colonos, o donatário Jorge de
Figueiredo Corrêa, restabeleceu o cargo a Romero. Consequentemente os conflitos
internos se intensificaram e muitos colonos abandonaram Ilhéus em direção a
Pernambuco e São Vicente. Essa instabilidade administrativa facilitou que
índios se revoltassem e resistissem a escravidão que lhes era imposta.
Essa relação de caráter
aparentemente pacifico no início da colonização, vem a se alterar quando os
elementos de dominação portuguesa se intensificam, gerando um descontentamento
dos índios tupiniquins. As constantes violações dos territórios indígenas e a
impossibilidade de cultivarem suas próprias plantações; a imposição do trabalho
escravo, fatores que desrespeitavam as relações indígenas, já que muitos
prisioneiros de guerra eram destinados a rituais antropofágicos. Além disso, os
portugueses não respeitavam as alianças e rivalidades tribais, tratando a
cultura indígena como homogênea. Sobre essa relação Baltazar da Silva Lisboa,
Ouvidor da Comarca afirma:
“a
ambição dos povoadores, junto com a tirania com que atacaram os índios, excitou
tanto ódio destes contra os portugueses, que em lugar de tirarem as vantagens
que o país, a ignorância e a singeleza dos índios lhes podia administrar, se
viram vexados e perdidos por muitas corridas que os índios de contínuo lhes
faziam, destruindo as suas lavouras e habitações, pondo-os no último risco de vida.”
(LISBOA, 1799 apud MOTT, p. 8)
. No que diz respeito à imigração portuguesa ao Brasil no período pós-independência, estimava-se em 2006, que seria de cinco milhões o número de luso-brasileiros, computando imigrantes portugueses e seus filhos e netos, o grupo que pela Lei de Nacionalidade portuguesa teria direito a adquirir cidadania lusa.Outra estimativa mais recente, de 2015, apontava 25 milhões de brasileiros quando, além de imigrantes, filhos e netos, se somam também os brasileiros bisnetos de portugueses, estes últimos já sem direito à cidadania portuguesa, de acordo com a Lei. Uma pesquisa de 1999, do sociólogo, ex-presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Simon Schwartzman, indicou que cerca de 10% dos brasileiros afirmaram ter ancestralidade portuguesa, percentual que, numa população de cerca de 200 milhões de brasileiros, representaria cerca de 20 milhões de luso-brasileiros.[8] Entre os brasileiros que obtiveram cidadania de países da União Europeia, 33% obtiveram cidadania portuguesa só no ano de 2013.
ResponderExcluirFoi mínima a ocupação portuguesa nos primeiros anos após a descoberta da nova terra por Portugal. O perfil dos primeiros habitantes portugueses em solo brasileiro é referente aos chamados degredados: o severo conjunto de leis manuelinas foi responsável pela condenação, por vezes injusta, de muitos portugueses ao degredo (banimento). De qualquer forma, o número de habitantes portugueses em território brasileiro era mínimo em relação aos quase 2 milhões de índios aborígines (número estatístico aproximado, pois na verdade é praticamente impossível determinar o número exato de habitantes aborígines).
ResponderExcluirFoi no ano de 1531, com Portugal sob o reinado de D. João III, que a política colonialista portuguesa em relação ao Brasil passou a tomar novos rumos: a expedição de Martim Afonso de Sousa ao Brasil manteve os objetivos das expedições anteriores, porém acrescentando-se a tais objetivos a efetivação da ocupação portuguesa em solo brasileiro. Portanto, a expedição de Martim Afonso de Sousa é tomada como o marco do início do processo de colonização portuguesa no Brasil. Uma nova mentalidade econômica que se afirmara a partir do século XV a antiga ordem feudal fora substituída pelos territórios das nações europeias unificados por um poder centralizante. À orientação econômica geral que estas nações passaram a seguir em sua busca por terras que oferecessem vantagens comerciais é resumida no conceito de mercantilismo. Essa orientação que na verdade nunca obtivera como origem uma formulação científica baseava-se em preceitos como: o acúmulo de riquezas através da detenção de metais preciosos, o que garantiria o poder econômico do Estado; o desenvolvimento manufatureiro como exclusividade da metrópole; a garantia dos domínios comerciais no exterior; o superávit da balança comercial, que originou políticas protecionistas e intervencionistas por parte dos estados. O conceito mercantilista teve projeção no processo de colonização da América paralela e contraditoriamente à projeção de certas características do mundo feudal em extinção, como pode ser observado na futura organização da colônia em capitanias.
Quando os portugueses chegaram no Brasil, os índios Tupiniquins já realizavam o escambo do pau-brasil (Caesalpinia echinata) com os franceses. Este foi um dos motivos que levou a coroa portuguesa a iniciar o povoamento o Brasil, com a implantação do sistema de capitanias hereditárias. Estas capitanias foram doadas a nobres da corte, os quais tinham como dever financiar o povoamento. Assim, em 1534 a capitania de São Jorge dos Ilhéus foi doada a Jorge de Figueiredo Correa. Em 1535, Francisco Romero, representante enviado por Portugal, ancorou na Ilha de Tindaré, a atual ilha do Morro de São Paulo. Semanas mais tarde, Romero e seus homens ancoraram mais do sul, onde fundaram a Vila de São Jorge dos Ilhéus.
ResponderExcluir